19 de outubro de 2011

A Vampira de Veneza


A crença na existência de vampiros, sejam eles esteriótipos tradicionais como aqueles criados na primeira metade do século XX baseados na obra de Bram Stoker e cuja expressão maior foi o Drácula personificado por Bela Lugosi ou aqueles cuja ancestralidade de sua aparência certamente faria qualquer fã da franquia Crepúsculo negá-los como vampiros está presente ainda em sociedades como a nossa. De fato nunca antes na história da sociedade ocidental um número tão grande de indivíduos se identificaram tanto com estas criaturas das trevas quanto agora e tal amplitude da cultura vampírica em muito deve sua magnitude ao cinema ou à literatura e mesmo à música que fez ressoar nos corações dos mais jovens o som mórbido da voz do vampiro.
Tal fenômeno atual é bem perceptível e é característico de um momento histórico, mas o que poderíamos dizer do vampiro quanto criatura histórica em outras épocas? Bem... provavelmente não poderíamos ir muito além daquilo que nosso conhecimento atual nos poderia permitir. Para aumentar um pouco mais nosso conhecimento sobre o assunto posso mencionar aquela que ficou conhecida como Vampira de Veneza.

Sua história recente começa em 2009 na Itália quando durante uma escavação arqueológica em meio a diversos esqueletos de vítimas de uma das muitas epidemias de peste bubônica ocorrida no séculos XVI na ilha de Lazzaretto Nuovo, perto de Veneza uma caveira chamou a atenção da equipe de arqueólogos. A caveira em questão tinha um tijolo aparentemente colocado à força dentro de sua boca o que para Matteo Borrini, antropólogo da Universidade de Florença, indica que a caveira poderia ter pertencido a um vampiro uma vez que naquela época objetos eram colocados na boca de supostos vampiros para impedir que eles se alimentassem dos cadáveres de pessoas enterradas nas proximidades, se fortalecessem e passassem a atacar os vivos. Uma das bases para a dedução de Matteo foi o livro de Philippus Rohr da Universidade de Lipsia escrito em 1679, sob o título: Dissertatio historico-philosophica de masticatione mortuorum.

Era uma crença comum na época que vampiros eram responsáveis pelas epidemias que ocorriam na Europa e por esse mesmo motivo constantemente os túmulos dos suspeitos de serem vampiros eram reabertos pelos coveiros cuja experiência em identificar vampiros apontava sinais tais como "marcas de mastigação" no tecido em que os corpos eram envoltos, o que automaticamente rendeu aos vampiros a fama de "comedores de mortalha", além disso sangue que brotava da boca ou mesmo abdômens inchados eram evidências de vampirismo.


Matteo Borrini
 Para Matteo Borrini a sucessão de pestes que assolaram a Europa por mais de 400 anos serviu para aumentar a crença de que vampiros estavam por trás das pestes, junte a isso o desconhecimento do processo de decomposição dos corpos e você tem um belo cenário formado. De acordo com textos médicos e religiosos da Idade Média, acreditava-se que os "mortos-vivos" espalhavam pestes para sugar o resto de vida dos cadáveres, e assim adquirir a força necessária para voltar às ruas. Segundo a crença uma forma de matar o vampiro consistia na remoção da mortalha que envolvia seu corpo, já que este servia de alimento para o morto-vivo e substituí-lo por alguma coisa que não servisse de alimento e por isso o tijolo pereceria uma boa escolha.

No entanto, as pesquisas de Matteo não param por aí, uma vez que entre outras coisas era necessário descobrir qual era o sexo da pessoa encontrada. Sim! pois ao contrário do que o título desta postagem possa denunciar não foi possível saber isso de imediato. Somente com análises forenses mais detalhadas foi possível identificar a mulher por trás dos ossos. Tendo descoberto que o crânio encontrado pertencia a uma mulher já podemos prever nossa imaginação romântica ocidental fantasiando-a como uma jovem e sensual Vampirella cujos trajes mínimos de látex se aproximam mais de um fetiche sadomasoquista recente do que da realidade medieval, no entanto, mais uma vez nossa fértil imaginação nos trai, pois o crânio pertencia a uma "anciã" cuja idade - qualquer coisa acima dos 50 anos - poderia ter sido a única coisa que em vida tivesse levantado suspeitas entre os já assustados cidadãos de Veneza de que tal longevidade era fruto do sangue de inocentes.
No passado a ignorância, a credulidade, os preconceitos foram a centelha que inflamaram o temor na Europa como uma fogueira cujas labaredas não deram descanso sequer à uma pobre senhora cuja morte não fora suficiente para apagar as brasas do temor que trazia à tona antigos medos e elegia novos culpados.

Não restam dúvidas de que inúmeras lendas sobre criaturas das trevas sedentas de sangue povoam o imaginário popular há milhares de anos e que com o passar do tempo estas lendas foram personificadas ou atribuídas a determinados grupos ou indivíduos. E se nos nossos tempos tais criaturas diabólicas perversamente se apoderam de nossos sonhos dos modos mais lasivos nos fazendo ver seus sinais saborosamente blasfemos gravados em toda parte não é de surpreender que cada nova descoberta pareça ser a comprovação de que eles de fato existem. Porque verdadeiramente eles existem e estão em toda parte podem até mesmo estar aí do seu lado, quem sabe pode estar aí dentro de você...

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